A lição dos professores

Estamos a viver o fim de um tempo. O fim da segunda guerra mundial criou um contexto internacional totalmente novo.

A consciência do desastre que foram aqueles seis anos de guerra, do sofrimento das populações, da falta de dignidade da vida humana e da maldade das ditaduras de esquerda e de direita levaram a maioria dos países ocidentais, a adotar uma forma de vida baseada na democracia, no bem comum, no respeito pela pessoa humana.

Criou-se a ideia de que o futuro seria sempre melhor através da cooperação entre todos.

Tudo isto foi vivido e, ao mesmo tempo, condicionado por uma guerra fria entre o bloco que se afirmava com estas convicções e aqueles que pretendiam manter um sistema autoritário e sem respeito pela pessoa.

Curiosamente, foi exactamente esta guerra fria que foi servindo de aglutinador aos países ocidentais que, confrontados com o risco de serem derrotados, foram mantendo um rigor de comportamento que os próprios cidadãos compreendiam e aceitavam.

Funcionava como promotora de uma moral que se sobrepunha ao conceito de liberdade sem responsabilidade e que a controlava. Uma barreira ao liberalismo e ao populismo.

Quando se desfez o bloco de leste, toda essa pressão de contenção foi sendo substituída por uma onda de ambição de crescimento económico que se impôs na maioria dos regimes democráticos e que tornou o imediato mais importante que o futuro e isso foi destruindo a estrutura da sociedade.

Em vez de valorizarmos aqueles que são mais importantes para o nosso futuro, valorizámos os que se impunham com maior força de contestação e os que nos poderiam limitar mais a nossa criação de riqueza imediata.

Com isto fomos deixando passar o tempo sobre situações injustificadas e incompreensíveis e esquecemo-nos de muitos daqueles que são essenciais ao futuro da nossa sociedade, do futuro dos nossos filhos.

Por outro lado, as estruturas que eram previstas existir para os defender, também se deixaram seguir por um caminho muito mais preocupados com a sua sobrevivência do que com a situação dos que deviam proteger.

E assim chegámos à situação que estamos a viver hoje relativamente aos professores.

Ninguém pode duvidar que os professores são um dos elos fundamentais da estrutura de uma sociedade. Contudo, quem olha para as condições de vida de um professor não pode deixar de compreender que não são condições dignas para ninguém e muito menos motivadoras para quem tem tanta responsabilidade.

Ao fim de tantos anos a fazerem notar o seu descontentamento sem que a sociedade, ou os governos, tivessem sequer tentado resolver o problema, conseguiram finalmente tomar uma posição que não poderá ser desconsiderada.

O mesmo já se tinha passado com os enfermeiros e também com os motoristas de transporte de mercadorias.

Sempre que alguém não consegue ser ouvido e atendido naquilo que lhe é justamente devido, é mais do que razoável que possa recorrer aos meios que encontrar para fazer valer a sua situação.

O que me preocupa é o padrão que estas diferentes situações revelam e que são alertas para a nossa sociedade.

Em todos estes casos, foi abandonado o caminho institucional pré-existente e utilizadas soluções populistas para conseguir obter os seus resultados.

Em todos estes casos o governo acabou por ter de ceder quando aquilo que deveria ter feito era prevenir que as condições fossem estabelecidas antes da contestação.

Em todos estes casos, e espero que tal não suceda com o dos professores, a solução dada foi de novo imediatista e nada se fez para se alterar a sustentabilidade daquelas profissões.

Estamos a acabar um tempo, mas é pena que seja para voltarmos a faltar ao respeito pela pessoa, ao isolacionismo e ao populismo, que acabará sempre por dar lugar ao autoritarismo.

Artigo publicado em Diário de Notícias no dia 20/01/2023